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Ao apagar as luzes

Por Clenes Guerreiro



Essa noite ficamos sem energia elétrica por um bom tempo – não posso precisar por quanto tempo foi, só sei que iniciou em torno de meia noite (horário comum para quem usa a internet até tarde, mesmo tendo trabalho e aula no dia seguinte) – o que me possibilitou uma série de reflexões sobre nossa condição contemporânea, nessa fase praticamente ‘pós-moderna’.


Estamos tão acostumados com as benesses da modernidade como computador, internet, luz elétrica, televisão, entre milhares de outros produtos e meios que necessitam da energia para funcionar... e como isso nos condiciona! Tanto que nos esquecemos de olhar a beleza cotidiana que a natureza nos oferta gratuitamente e sem o perigo imediato de nos tirar – mesmo que por poucas horas – para nos desesperar e não sabermos exatamente o que fazer.



Essa falta momentânea de luz elétrica me impossibilitou de dar continuidade aos meus trabalhos de conclusão dos Cursos que faço, dos sites de relacionamento que participo, até mesmo de ler o livro que estou lendo – intitulado de ‘Perversa Confissão’, de David Rosenfelt, adquirido através da rede mundial de computadores, em formato impresso em gráfica, meio que em desacordo com as preocupações também contemporâneas com o meio ambiente e o gasto desenfreado de papel. Tudo bem, isso não me deixou contente. Mas me fez perceber algumas coisas...



Abri a janela e olhei para o céu. Tenho certo vício de olhar as estrelas e imaginar, de forma surrealista, todo um universo que se descortina além do que nossos olhos podem ver. Mas vi além disso essa noite. Vi estrelas mais brilhantes em um céu esplêndido xapuriense, como há muito tempo não contemplava – a última vez que vi beleza semelhante (se não foi maior) era quando visitava os seringais da região, quando estes também não tinham energia elétrica, e na madrugada me dava ao luxo de dedicar algumas horas a enxergar o que a natureza noturna podia nos oferecer sobre cabeças humanas – e o fazia de forma insana.



Quando a luz voltou fiquei meio desnorteado com o que fazer – continuar contemplando o céu, que perdera sua beleza de poucos instantes atrás ou voltar para o computador e viver a vida compartilhada com o mundo, porém solitária, ao mesmo tempo que moderna?



Isso me fez recordar de uma história que uma contadora mencionava um dia: “uma vez, ao apagar a luz, uma mulher muito idosa se admirava com os jovens reclamando e se desesperando: ‘Não sei do que esses garotos reclamam tanto, nos seringais de antigamente nem tínhamos luz elétrica e a gente era tão feliz’”.



Os benefícios da tecnologia são maravilhosos mas não devemos esquecer que somos seres da natureza e a partir dela devemos agradecer e admirar o que ela nos oferta sem cobrar nada em troca.



Por fim, ao apagar das luzes, podemos descobrir que por trás de uma escuridão desesperadora podemos encontrar muito mais do que um simples achar que se está no fim do mundo – porque, independentemente de onde e em que condições se encontra, todos estamos apenas no começo da compreensão da perfeição que nele há!



Ilustração:


*A Noite Estrelada - Van Gogh

Comentários

Professora Ada disse…
Tenho acompanhado esse blog há muito tempo e muito tenho gostado de seu conteúdo. Não agride ninguém, conta uma história na visão de quem vive os momentos de Xapuri (conhecida internacionalmente). Eu não sou nem acreana, mas me orgulho do povo que mora aí.
Parabéns aos guerreiros Clenes E Caticilene.

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